Uma ação civil pública proposta pelo ministérios públicos Federal (MPF) e Trabalho (MPT) neste fim de semana busca derrubar parte do decreto estadual de calamidade pública, de 26 de abril, e fechar atividades não essenciais. Entre as determinações da ordem consta deixar com os municípios a responsabilidade pela retomada de atividades econômicas, sociais e escolares.
A ação foi ajuizada também contra a União, requerendo que sejam cumpridas uma série de requisitos antes de flexibilizações nas medidas de isolamento social adotadas em 20 de março em Rondônia (veja ponto a ponto o que os órgãos contestam ao fim desta reportagem).
Segundo o MP, o decreto nº 24.979 “extrapola o poder regulamentar e não guarda conexão técnica, científica ou jurídica com a Lei 13.979/20 […] colocando em risco a saúde pública”.
Os procuradores buscam que o governo do Estado não adote qualquer medida que permita o funcionamento de atividades não essenciais enquanto durar o Estado de Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (Espin), decorrente da pandemia do novo coronavírus, sem a prévia apresentação de justificativa técnica fundamentada.
O documento, que tem mais de 90 páginas, cita vários países e estados que seguiram um isolamento mais rígido, além de outros que enfrentam caos na rede hospitalar.https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html
Entre os argumentos usados pelos procuradores está um estudo do professor Artur de Souza Moret, da Universidade Federal de Rondônia (Unir). O trabalho prevê quase 10 mil mortes por Covid-19 em Rondônia no pior cenário com medidas pouco rígidas de isolamento.
Os autores da ação também mencionam o alinhamento do governo de Rondônia ao discurso do presidente Jair Bolsonaro, que defende a reabertura de escolas e comércios.
Um dos principais pontos colocados na ação é a falta de leitos clínicos e de UTI para atender os pacientes tanto do novo coronavírus, quanto das demandas comuns do sistema de saúde. Além disso, o documento destaca o baixo número de testes realizados na população.
Os procuradores também criticam a edição dos decretos estaduais após a terminar a validade do anterior. Essa prática faz que decisões da Justiça percam validade e dá nova chance ao Estado de flexibilizar o isolamento social.
O MPF e o MPT pediram na Justiça o fechamento de:
- lotéricas e caixas eletrônicos;
- consultórios veterinários (exceto em regime de plantão);
- comércio de produtos agropecuários;
- pet shops e lojas de máquinas e implementos agrícolas;
- lava-jatos;
- indústrias;
- obras e serviços de engenharia;
- lojas de materiais de construções;
- escritórios de contabilidade, advocacia e cartórios;
- restaurantes e lanchonetes;
- lojas de equipamentos de informática, livrarias, papelarias e armarinhos;
- lavanderias;
- concessionárias e vistorias veiculares;
- lojas de eletrodomésticos, móveis e utensílios.
“Autorização materializada no decreto para diversas atividades tidas “municipais” e a indústria em geral (mesmo sem vinculação à atividade essencial) viola a razoabilidade a proporcionalidade, além de expor a evidente risco a saúde da população”, consta ainda na ação.
Também é requerida a suspensão do trecho do artigo que autoriza abertura das escolas municipais após 4 de maio “sem prever qualquer critério ou fundamento técnico até que sejam cumpridos todos os requisitos enumerados pela OMS ou o plano e as classificações de risco dos boletins epidemiológicos do Ministério da Saúde”.
O artigo do mesmo decreto que autoriza o funcionamento de cinemas, teatros, bares, clubes, academias, banhos e balneários, casas de shows, boates, galerias de lojas, shopping centers, centros comerciais a partir de 4 de maio também é alvo de pedido de suspensão pelos procuradores.
O que o MPF e MPT requerem?
- Que se abstenha de editar novos decretos que tratem de atividades e serviços essenciais sem observar a lista do Decreto Federal que trata desses serviços e as recomendações técnicas e científicas dispostas na lei das medidas de enfrentamento à emergência de saúde pública de importância internacional;
- Que providencie o apoio técnico-científico, material e logístico solicitado pelo Estado de Rondônia, para o atendimento das medidas condicionantes, inclusive com envio de novos leitos de UTI e, se necessário, com o envio de equipe do Ministério da Saúde a Rondônia. Caso não seja possível fornecer o material, que subsidie as compras efetivadas pelo Estado;
- Que apresente, em 5 dias, justificativa técnica fundamentada de forma a viabilizar, com segurança, eventual transição para a estratégia de distanciamento social seletivo que venha a ser adotada pelo Estado de Rondônia, que inclua análise da execução de testagem e de projeções baseadas em estudos de cenário da pandemia no Estado e correlação entre tais projeções e a estruturação dos serviços de atenção à saúde (equipamentos, insumos e pessoal).
O documento solicita ainda que a Justiça determine à União e o Estado a não adoção de qualquer estímulo à não observância do isolamento social recomendado pela OMS e o compromisso com o direito à informação e o dever de justificativa dos atos normativos e medidas de saúde, sob pena de multa de R$ 500 mil.
Apesar dos procuradores pedirem providências em caráter de urgência, a ação deve proseguir com ou sem a concessão de liminar.
A ação é assinada por três procuradores da República e dois procuradores do trabalho, com pedido de urgência. O julgamento pode ocorrer a qualquer momento durante o plantão da Justiça Federal.
A nossa redação entrou em contato com o governo para um posicionamento e aguarda retorno.
Por Diêgo Holanda, do G1