Em reação às iniciativas do Congresso para criar mandatos e restringir decisões individuais do STF (Supremo Tribunal Federal), o ministro Luís Roberto Barroso disse nesta quarta-feira (4) que não é hora de fazer mudanças na corte.
“Pessoalmente, acho que o Supremo (…) talvez seja uma das instituições que melhor serviu ao Brasil na preservação da democracia. Não está em hora de se mexer”, afirmou Barroso, que é o presidente do Supremo, antes de sessão no plenário do tribunal.
Barroso falou após uma cobrança pública do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sobre os limites dos Poderes, em recado ao Judiciário, e também logo depois de o Senado ter iniciado uma ofensiva contra o tribunal em uma votação relâmpago na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).
Nas últimas semanas, a tensão entre o STF e o Congresso escalou, com deputados articulando obstruções na Câmara e senadores votando projetos em reação às recentes decisões da mais alta instância do Judiciário.
A bancada ruralista e a oposição na Câmara, por exemplo, decidiram se alinhar ao movimento iniciado no Senado de confrontar decisões recentes de temas pautados no STF, com mais destaque sobre aborto, marco temporal, descriminalização das drogas e imposto sindical.
Em sua fala, Barroso disse que “vê com grande naturalidade a discussão sobre temas de interesse nacional” no Congresso. “Eu compreendo. Compreender não significa concordar”, afirmou.
“Em síntese, acho que o lugar em que se faz o debate público das questões nacionais é o Congresso, e portanto vejo com naturalidade que o debate esteja sendo feito, mas nós participamos desse debate também.”
Também nesta quarta, Lira afirmou mais cedo que os Poderes da República precisam se manter dentro dos limites constitucionais e disse ter “absoluta certeza” de que o Congresso os obedece.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) tem defendido que ministros do Supremo tenham mandato e que seja elevada a idade mínima para ingresso na corte.
Pacheco, que já se manifestou anteriormente favorável a essas propostas, afirmou que, após o presidente Lula (PT) indicar o substituto de Rosa Weber, o Senado pode começar a discutir o assunto.
O decano do STF, ministro Gilmar Mendes, do STF, criticou a proposta para que juízes da corte tenham mandato.
Na terça (3), em rede social, Gilmar disse que “ressuscitaram a ideia” e que, “pelo que se fala, a proposta se fará acompanhar do loteamento das vagas, em proveito de certos órgãos”.
Na semana passada, também começou a tramitar na Câmara uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que, caso aprovada, permitiria ao Congresso derrubar decisões do Supremo.
Ainda nesta quarta, também antes da fala de Barroso, a CCJ do Senado aprovou em votação relâmpago uma PEC que limita as decisões monocráticas (individuais) e pedidos de vista (mais tempo para análise) em tribunais superiores. A votação durou menos de um minuto.
A medida ainda tem que ser aprovada pelo plenário do próprio Senado e no da Câmara dos Deputados para ter validade. A proposta foi apresentada pelo senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e recebeu voto favorável do relator, Esperidião Amin (PP-SC).
A PEC que foi aprovada na CCJ prevê que decisões dadas por apenas um magistrado não possam suspender a eficácia de lei ou ato normativo com efeito geral ou ato dos presidente da República, do Senado ou da Câmara.
Nesses casos, só seria possível decisões individuais durante o recesso do Judiciário, em caso de grave urgência ou risco de dano irreparável, mas o tribunal deveria então julgar esse caso em 30 dias após a retomada dos trabalhos.
A medida também prevê que pedidos de vista (mais tempo para analisar os casos) devem ser concedidos coletivamente e não individualmente, por cada magistrado por um prazo máximo de seis meses, com possibilidade de extensão por mais três.
Ao comentar a ofensiva contra o Supremo, Barroso disse que vê com muita ressalva a reversão de decisões da corte, “até porque nós já tivemos um precedente na história brasileira que foi a Constituição de 1937, na ditadura Vargas”.
A respeito de mandatos para ministros, ele lembrou que houve uma discussão a esse respeito quando foi produzida a Constituição de 1988, e que se optou pela vitaliciedade.
“Como a Constituição escolheu um determinado modelo, pior do que não ter um modelo ideal é ter um modelo que não se consolida nunca. Por essa razão, também não vejo com simpatia, embora veja com todo respeito a vontade de discutir esse tema”, disse.
A respeito de restrição de decisões individuais, Barroso afirmou que “a questão da colegialidade é muito importante”, mas que acha que isso foi resolvido “por decisão recente liderada pela ministra Rosa Weber”.
No ano passado, a corte aprovou em sessão administrativa fechada ao público uma emenda ao seu regimento interno que impõe um prazo para a devolução de pedidos de vista e que também restringiu as decisões individuais dos ministros.