No dia 14 de maio de 2020, a desembargadora Marialva Henriques Daldegan Bueno, relatora dos autos 0803189-66.2020.8.22.0000, em mandado de segurança, deferiu medida liminar postulada pela OAB/RO para autorizar o funcionamento de escritórios de advocacia como serviços essenciais, com observância das medidas de prevenção de saúde pública de combate ao COVID-19, previstas nos atos normativos do Poder Executivo Estadual e Municipal.
No pedido inicial, a OAB aduziu, em resumo, que a indigitada norma no seu art. 8º previu quatro fases para retomada das atividades segundo critérios de proteção à saúde, econômicos e sociais indispensáveis ao atendimento das necessidades básicas da comunidade, porém, ao autorizar o funcionamento das atividades essenciais e permitidas na “primeira fase” (Anexo I do referido decreto), não restou previsto o exercício da advocacia, nem o funcionamento de escritórios de advocacia, apesar de ter liberado atividades comerciais de outros segmentos, que possuem atendimento ao público externo. Esclareceu que apenas na segunda fase de retomada das atividades (Anexo II do r. Decreto) é que houve a previsão de ser autorizado o funcionamento dos escritórios de advocacia. Além disso, afirma que o citado Decreto impõe tratamento desigual aos advogados atuantes nos demais municípios do Estado, à exceção de Porto Velho, Guajará-Mirim e Ariquemes, pois nas outras regiões (Anexo IV) a abertura comercial ampliada (incluindo-se o escritório de advocacia) está autorizada apenas na terceira fase (art. 8º. IV do Dec. n. 25.049/20). Frisou também que, embora a liberação das atividades comerciais em cada fase seja feita gradualmente a depender da eficácia das medidas de saúde pública adotadas, a confirmação de funcionamento das atividades comerciais nas respectivas fases será realizada no prazo de 10 (dez) dias, mas o prazo de permanência dos municípios nas fases serão, obrigatoriamente, de no mínimo 14 (quatorze) dias, a teor do art. 8º, §1º e art. 9º § 1º ambos do Decreto n. 25.049/20.
Pontuou que nesse panorama, o referido Decreto não apenas desconsidera o caráter de essencialidade da atividade de advocacia, prevista no art. 133 da Constituição Federal e no Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei n. 8.906/1994), como também, impõe restrição ao funcionamento dos escritórios dos advogados, violando direito e líquido e certo desses profissionais que são indispensáveis à administração da Justiça. Prosseguiu alegando que o ato coator, além de cercear o exercício da advocacia judiciária, também inviabiliza aos advogados de exercer a advocacia de cunho administrativo, tal como frequentar delegacias e flagrantes de clientes, ou possam frequentar empresas que venham sofrer interdições no poder de polícia, nem exercer advocacia ambiental, previdenciária, tributária, nem atendimentos a clientes em seus escritórios.
Destacou, contudo, que é perfeitamente compatível o atendimento presencial de clientes, com as cautelas de segurança sanitária (atendimento individual, uso de máscara, álcool e luvas) previstas no referido decreto estadual. Ao final, pede a concessão de medida liminar, para que se determine ao Governador de Rondônia que declare a advocacia como atividade essencial, exercível mesmo durante o período de combate à pandemia de COVID-19, sem restringir-lhes a atuação administrativa, assegurando que todos os advogados e sociedades de advocacia do Estado de Rondônia possam atender presencialmente o público externo e os seus clientes, em seus escritórios profissionais ou fora dele, em qualquer dos Municípios do Estado do Rondônia, desde que observadas as recomendações de higiene e política sanitária. No mérito, requer a confirmação da decisão liminar.
Ao analisar o pedido inicial, a relatora assim descreveu: “É cediço que para a concessão de medida liminar, prevista no artigo 7º, III, da Lei 12.016/09, deve ser avaliada a probabilidade do direito, revestida pela máxima do fumus boni iuris, e o perigo da demora na prestação jurisdicional. De fato, a medida liminar é provimento cautelar admitido pela lei do mandado de segurança quando sejam relevantes os fundamentos da impetração e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da ordem judicial, se concedida ao final. No caso dos autos, verifico que o Decreto Estadual n. 25.049, de 13 de maio de 2020, ao estabelecer regras de distanciamento social e permitir a retomada da economia de forma gradual no atual momento de enfrentamento à pandemia pelo COVID-19 no Estado de Rondônia, deixou de incluir na primeira fase de implantação, o exercício da advocacia privada como atividade essencial, consoante previsto na Constituição Federal e no Estatuto da Advocacia (Lei n. 8.906/1994).
Sabe-se que tal como a atividade jurisdicional do Judiciário é considerada de natureza essencial, igual caráter possui a advocacia particular, a rigor do art. 133 da Constituição Federal que dispõe: “ O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei ”. Como consabido, as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa previstas no art. 5º, LV, da Constituição Federal são exercidas, via de regra, pelos advogados, os quais prestam serviço público, exercem função social, nos termos do art. 2º do Estatuto da Advocacia e são indispensáveis para garantir o acesso à justiça, especialmente, neste período emergencial. Tais considerações evidenciam nos autos a probabilidade do direito alegado pela Impetrante, referente à necessidade de atribuir o caráter de essencialidade às atividades da advocacia privada.
Da mesma forma, extrai-se dos autos o perigo de dano ou de periculum in mora, porquanto, impedir o advogado de exercer sua profissão nessa “primeira fase” citada no Decreto Estadual, pode causar dano irreparável para as partes na postulação e defesa de seus direitos, inclusive aos causídicos que precisam realizar atendimentos presenciais de cliente que não tem acesso à internet, ou mesmo que tenha dificuldade de lidar com as novas tecnologias a fim de viabilizar o acesso à Justiça. Outrossim, cumpre ressaltar que o reconhecimento do exercício da advocacia como atividade essencial não implica que os advogados não devam cumprir com as recomendações de saúde pública explicitadas no referido decreto estadual, bem como da Organização Mundial de Saúde, do Ministério da Saúde e das autoridades locais, quanto ao uso de máscara, higienização frequente das mãos e objetos de uso comum, evitar aglomerações, previstas nos atos normativos do Poder Executivo Estadual e Municipal, por ocasião do exercícios de suas indispensáveis atividades, como forma de preservar a saúde de todos.
Com estas considerações, defiro o pedido de liminar pleiteado para autorizar o funcionamento de escritórios de advocacia como serviços essenciais, com observância das medidas de prevenção de saúde pública de combate ao COVID-19, previstas nos atos normativos do Poder Executivo Estadual e Municipal. Determino a notificação da d. autoridade apontada como coatora para, no prazo de 10 (dez) dias legal preste as informações que entender de direito, conforme preceitua o art. 7º, I da Lei n. 12.016/2009. Dê-se ciência do feito à Procuradoria Geral do Estado, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito, na forma do art. 7º, II da Lei n. 12.016/2009. Após, vista à douta Procuradoria Geral de Justiça, em atenção ao disposto no art. 12 da lei supracitada. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se. Porto Velho, 14 de maio de 2020. Desembargadora Marialva Henriques Daldegan Bueno. Relatora”.
Da redação – Planeta Folha