Desembargadora Daise Fajardo Nogueira Jacot manteve liminar que determinou a redução de 50% no aluguel de uma loja de roupas, em razão do momento de crise. A crise econômica causada pela Covid-19 tem levado empresas a buscar na Justiça a suspensão ou diminuição dos valores de aluguéis. A situação delicada, decorrente da inadimplência e das dificuldades das empresas em cumprirem suas obrigações, se deve, em grande parte, às medidas adotadas para conter o avanço do novo coronavírus — entre elas, o fechamento de comércios e serviços não essenciais por decretos de governadores e prefeitos. É inegável o impacto da epidemia nas receitas de empresas, empresários e de empregados.
Quase todos sofrerão alguma espécie de redução em seus ganhos. A lei civil prevê a possibilidade de revisão de contratos. Estes podem ser revisados quando eventos em circunstâncias excepcionais, que não eram previsíveis quando da celebração do pacto e que tornam suas prestações excessivamente onerosas para uma das partes. Assim, quando a negociação entre as partes e o recíproco bom senso não são suficientes à repactuação, propor uma ação judicial acaba sendo o único caminho. E o Judiciário tem se demonstrado sensível ao momento excepcional da economia. É que revelam alguns julgados da segunda instância selecionados pela ConJur.
O desembargador Fábio Podestá, da 27ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP, por exemplo, determinou a redução em 50% do valor do aluguel, a contar do presente mês, pelo prazo de 60 dias, pago por uma empresa em recuperação judicial, devido aos efeitos do coronavírus no mercado. Segundo o advogado da empresa, Roberto Keppler, sócio do Keppler Advogados Associados, a medida, além de benéfica à manutenção da empresa durante o período da crise, mostra um poder Judiciário atuante e apto a guarnecer os interesses da população. Já a desembargadora Daise Fajardo Nogueira Jacot, da 27ª câmara de Direito Privado do TJ-SP, indeferiu agravo de instrumento e manteve liminar que determinou a redução de 50% no aluguel de uma loja de roupas, em razão do momento de crise que o país enfrenta.
Por outro lado, o mesmo tribunal (TJ-SP) também entendeu, em outro caso, que a epidemia do novo coronavírus não pode ser invocada, de maneira genérica, sem qualquer comprovação documental, com vistas à cessação ou suspensão de contratos em curso no Distrito Federal, o desembargador Eustáquio de Castro determinou a redução do valor do aluguel de um escritório de advocacia de R$ 2 mil para R$ 1,3 mil mensais, referente aos meses de março, abril e maio de 2020 (processo número 0707596-27.2020.8.07.0000).
“Nesse momento, é preciso ter em mente os princípios que regem o direito dos contratos no Brasil, dentre eles os da preservação e função social dos contratos e o da boa-fé objetiva. Tanto é assim que o artigo 478 do Código Civil permite a resolução dos contratos de execução continuada ou diferida, quando a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, mas exige que se demonstre vantagem para a outra parte, o que é difícil no atual cenário”, diz o advogado Ulisses Sousa, sócio do Ulisses Sousa Advogados. “Logo em seguida, no artigo 479, o Código Civil prevê que a resolução do contrato poderá ser evitada mediante oferta ao réu da possibilidade de modificar equitativamente as condições do contrato. Perceba-se que, em se tratando de contrato civil, aceitar a modificação do que foi pactuado é uma faculdade do credor e não uma obrigação”, complementa.
Deve-se considerar, de todo modo, que o locatário também sofre as consequências da crise — e não apenas os inquilinos, cujas atividades empresariais vêm minguando. “Assim como os locatários, locadores também estão enfrentando dificuldades financeiras, e muitos deles, inclusive, utilizam-se da renda com os aluguéis para seu sustento próprio e de familiares”, lembra Rodrigo Ferrari Iaquinta, sócio do BNZ Advogados. “Os locatários que estejam enfrentando este tipo de dificuldade devem buscar os locadores com argumentos concretos, ou seja, com documentos que comprovem esta dificuldade financeira, como comprovantes de redução de renda e carta de demissão”, alerta. Iaquinta alerta, ainda, que os novos pactos relativos aos aluguéis não abrangem os vencimentos de taxas condominiais, IPTU e demais obrigações ligadas aos imóveis, mas que são cobradas por pessoas distintas do locador.
Aprovado pelo Senado no dia 3 de abril, o Projeto de Lei 1.179/2020, que suspende temporariamente regras do Direito Privado enquanto durar a epidemia do coronavírus no Brasil, proíbe, até 31 de dezembro de 2020, liminar de despejo em ações ajuizadas a partir de 20 de março, data estabelecida como marco inicial da pandemia no país.
Apesar de a lei não ter sido sancionada, o Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu ordem de despejo por falta de pagamento em decorrência da epidemia do Covid-19.
Fonte: Consultor Jurídico, em 01/06/2020.