O marido da médica Letícia Bortolini, Aritony de Alencar negou durante depoimento à Justiça que a esposa tenha ingerido bebida alcoólica antes de dirigir o Jeep Compass que atropelou e matou o verdureiro Francisco Lúcio Maia.
Aritony, que também é médico, chorou durante o depoimento nesta quinta-feira (2), no Fórum de Cuiabá, em audiência de instrução da ação penal que a esposa responde por homicídio, omissão de socorro e embriaguez ao volante.
As informações são do site Mídia News.
“Ela não bebeu. Na delegacia disse que não sabia se ela havia bebido. Mas, já repassamos aquele dia na cabeça várias vezes e ela disse ter certeza que não bebeu e acredito nela”, disse o médico.
Na noite de 14 de abril de 2018, o casal retornava de uma festa “open bar”, momento em que a médica seguia pela Avenida Miguel Sutil, segundo perícia, a mais de 100 km/h, numa via onde a velocidade permitida é apenas de 60 km/h.
No depoimento ao juiz Flávio Miraglia Fernandes, da 12ª Vara Criminal de Cuiabá, Aritony contou que os dois compraram os ingressos para a festa, mas que no dia a esposa não estava se sentindo bem. Foi ele quem teria insistido para que ambos fossem ao evento.
“Chegamos por volta de 14h30, encontramos alguns amigos, fomos passando de barraquinha em barraquinha para experimentar as comidas. A Louvada estava fazendo o lançamento da cerveja e para conseguir pegar tinha que ficar em uma fila. A Letícia entrou junto para pegar cerveja para mim. Ela não bebeu”, disse ele.
O casal, segundo o médico, deixou a festa por volta das 19h30, por conta do congestionamento e por causa da demora para sair do local acabou dormindo no carro.
Aritony de Alencar também afirma não ter visto nem sentido o impacto do atropelamento, por isso não prestaram socorro ao verdureiro e foram direto para casa.
“Nisso, a Polícia Militar chegou e determinou que fôssemos para a delegacia. Não estávamos entendendo nada. Quando nos informaram que a Letícia havia atropelado uma pessoa, entramos em desespero. Ela não viu nada, não fazia ideia”, disse.
A versão desmente a dada pela médica na audiência de custódia. À época, Letícia disse ter achado que atingiu um animal por isso não parou o veículo.
“Em nenhum momento ela demonstrou arrependimento ou nos procurou. Ainda comparou meu pai com um bicho. Isso me revoltou muito”, desabafa Francinilda da Silvia Lúcio, de 25 anos, uma das três filhas do verdureiro no dia em que a médica foi solta, logo após o acidente.
Foi neste trecho da oitiva que o médico chorou.
“Ela não sabia que havia atropelado uma pessoa. Somos médicos. Trabalhamos para salvar pessoas”, afirmou.
Além do marido de Letícia, familiares do verdureiro foram ouvidos. Já a médica não prestou depoimento na audiência desta quinta-feira.
O magistrado remarcou a oitiva para 3 de março de 2022.
Dia do acidente
O acidente aconteceu próximo à rotatória que dá acesso ao Bairro Cidade Verde. Francisco voltava para casa com o seu carrinho de feira quando o Jeep da médica o atingiu próximo ao canteiro central.
Francinilda recorda que estava indo de moto com a mãe visitar o tio em Várzea Grande quando recebeu a ligação de uma conhecida dizendo que o seu pai sofreu um acidente.
“Não passou pela minha cabeça que ele estaria morto. Pensei que tinha se machucado, quebrado uma perna, ou coisa do tipo”.
Conta que quando chegou ao local se deparou com o corpo do pai “abraçado” numa árvore.
“Só quando os médicos do Samu [Serviço de Atendimento Móvel de Urgência] atestaram a morte que caiu a ficha. Foi aí que desabei de vez e comecei a chorar compulsivamente”, lembra.
“Só depois que o meu pai faleceu as autoridades resolveram colocar faixa de pedestre, redutor de velocidade e semáforo no local do acidente”.
Quem era Francisco
Francisco Lúcio Maia era natural da Paraíba e veio para Mato Grosso com apenas 18 anos e depois mandou buscar a esposa e filhas. Em Cuiabá, garantiu o sustento da família a partir da venda de hortaliças, frutas e verduras por mais de 20 anos.
Francinilda recorda que o pai acordava todo dia às 3h e fazia uma “viagem” de 30 quilômetros até o Bairro Jardim Industriário, em Cuiabá, para comprar produtos. Depois voltava para sua casa, empacotava as verduras, as colocava no carrinho e por volta das 5h30 seguia para o seu ponto comercial em frente ao posto de saúde do Bairro Cidade Alta, também na Capital.
“Eu morava ao lado do meu pai no Bairro Coophamil [Cuiabá]. Então eu saia de moto para trabalhar e todo dia eu via ele arrumando a verdura bem cedinho. Eu falava ‘sua benção pai’ e seguia viagem. Hoje em dia eu não tenho mais isso”, lembra a filha com a voz embargada.
Denuncia MPE
Em 11 de setembro de 2018, cinco meses depois do acidente, o promotor Vinícius Gahyva Martins, da 1º Promotoria de Justiça Criminal, denunciou Letícia pela prática de quatro crimes: homicídio doloso (quando não há intenção de matar), omissão de socorro, embriaguez ao volante, e por se afastar do local do acidente fugindo da responsabilidade.
No documento, Gahyva destaca que na ocasião do acidente a médica provocou a morte do verdureiro, “deixando de prestar-lhe imediato socorro, bem como afastou-se do local do acidente para fugir da responsabilidade civil e penal”.
O promotor ressaltou também que mesmo após o atropelamento, a médica conduziu o veículo – Jeep – sob a influência de bebida alcoólica.
O juiz de Direto Flávio Miraglia Fernandes recebeu a denúncia em 19 de setembro – oito dias depois de o documento ser protocolado pelo MP na Décima Segunda Vara Criminal.
Via repórter MT